a rua é da gente

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sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Aos jovens idealistas, Solla, Nahor e Ale, e à princesa Alice.

 
                                                               PROIBIDO PROIBIR

     Essa pichação feita nos muros de Paris, em 68, ganhou o mundo e traduziu com perfeição o espírito libertário de uma juventude que queria mudar o mundo. Hoje, esse espírito, propulsor de revoluções sociais, culturais e científicas ao longo dos séculos, cedeu terreno para o discurso conservador que tem embalado os sonhos de um punhado de gente jovem e madura que quer acabar com a corrupção no Brasil.
    Prova disso é que, poucos meses atrás, o movimento contra à corrupção ganhou, aqui, em São Paulo, a adesão da Associação da Parada do Orgulho GLBT e pronto: alguns integrantes torceram o nariz para essa aliança e dispararam posts e emails nas redes sociais, em que diziam, basicamente, que não  engrossariam manifestações que, por contar com o pessoal da Parada, seriam contra a família e a ordem social.
     Basta dar uma navegada nas páginas de alguns desses grupos para se ter a impressão que se, pudessem, diversos de seus integrantes não despachariam apenas os homossexuais para outro planeta. Eles também aproveitariam a nave espacial para se livrar de dependentes químicos, ex-moradores da favela Pinheirinho, empresários que contratam profissionais estrangeiros, defensores da legalização do aborto e/ou de uma política pública para, pelo menos, reduzi-lo, críticos da ditadura militar, favoráveis à campanha do desarmamento, além de petistas, simpatizantes, que ganharam o apelido de Petralha. E, em especial, qualquer um que conteste suas ideias, também chamado de Petralha, fake, infiltrado e autoritário.
   Na contramão desse povo, eu tive o prazer de ver entrar em cena cavaleiros solitários que deram uma lufada de vento fresco a esses embates. É claro que falam para um exército com uma séria deficiência auditiva, que o impede de ouvir tudo o que não lhe soa bem. Mas esses jovens idealistas não são do tipo que jogam a tolha por falta de incentivo da torcida. O professor Nahor Lopes Jr., de 26 anos, e o atrevido Ale Brasil/Virgu Lino, de 28 anos, por exemplo, vira e mexe, enfrentam uma dezena de lutadores conservadores que, como dizia o bom e finado colunista social Athaíde Patreze, acham o deputado federal Jair Bolsanaro e o período da ditadura militar um luxo!
   Nahor tira proveito de sua sólida formação cultural e vocação para transmitir e compartilhar conhecimentos, talvez até, para baixar a guarda e ampliar o  leque de informações de alguns deles, com outras ideias, teorias e palavras. Como resultado, o professor, e não os seus argumentos, como seria natural, vira o alvo da discussão e ele começa a ser insultado. Ora de petista, ou melhor, Petralha, como dizem . Ora de professor que não sabe nada da história do Brasil.
  Católico até a medula, o catarinense lembra que Deus condena o pecado, mas não o pecador. E já que citam tanto o Seu Nome nesses espaços, vale ressaltar que Ele, em sua infinita sabedoria e misericórdia, nos concedeu a vida, o livre-arbítrio e o perdão. O que, pra mim, indica que Deus não compactua com nenhuma forma de opressão e acolhe todos os seus filhos, e com todos os seus pecados.
    Os desaforos, um dos pecados mais cometidos por essa turminha insólita, nem sequer arqueariam uma mísera sobrancelha se não saíssem da língua de quem enche a  boca pra falar em democracia, mas é incapaz de manter um debate de ideias no campo das ideias. Que o diga Ale, analista de compras, de 28 anos, que, além de petralha, of course, também é tachado de comunista, hipócrita etc nesse território minado de convicções pra lá de ultrapassadas. Que, diga-se de passagem, foram soterradas e/ou descartadas há décadas por autoridades mundiais, que se debruçam, por anos a fio, sobre a tarefa de estudar, desvendar e encontrar soluções para n problemas contemporâneos.
   De natureza impetuosa, esse paulistano solta o verbo, sem recorrer a ofensas e outras baixarias, em defesa da atual compreensão que pesquisadores do mundo inteiro tem de uma série de questões e enfrenta chumbo, cada vez mais grosso, disparado pela artilharia conservadora.
   Outro jovem idealista, Francisco Solla, decidiu parar de, como dizem os chineses, atirar pérolas aos porcos desse exército virtual e foi lutar com outra farda. Dono de um bom senso de causar inveja, o estudante, de 18 anos, que acaba de ingressar na Unicamp, se movimentou com elegância entre esses internautas democratas que, ao serem contrariados, ardem na fogueira das vaidades e promovem uma espécie de caça às bruxas.As bruxas, no caso, são qualquer um que, além de discordar de suas brilhantes ideias, se atreva questionar decisões e "verdades". Como Solla cometeu esses crimes, ele, claro, também caiu na língua dos conservadores. Mas nem ligou para as ofensas. É que o estudante baiano já havia sido abatido pela perda de um sonho: o de acreditar que, no combate contra à corrupção, todos eram movidos, exclusivamente, pelo  idealismo.
     Esses rapazes são apenas três entre milhões que perdem batalhas para aqueles que comungam com o ideário conservador e autoritário. Se hoje, eles lutam contra os ganchos de direita da turma que reeditou no espaço virtual as famosas marchas com Deus, pela família e propriedade, contra a guitarra elétrica etc dos anos 60. Amanhã, terão de enfrentar golpes vindos de outros frontes.
     E como acontece com todos, eles vão perder e ganhar nos sucessivos embates por uma vida e um mundo melhor. Em compensação, na volta, serão sempre recebidos pela princesa Alice - uma menina linda, de 15 anos, de apurado senso estético, que, como tantas outras meninas, nasceu para embelezar  e zelar pela beleza do mundo.
   Espero, também, que esses cavaleiros nunca comprem o discurso de que ser idealista, após uma certa idade, é burrice. Burrice pra quem?  Há quem interessa arrefecer o entusiasmo de gente que quer fazer desse mundo um bom lugar para se viver?
   Einstein dizia que é mais fácil dividir um átomo que quebrar um preconceito. Imagine, então, ter de lidar com preconceituosos e sectários para tentar promover mudanças que contribuam para o bem-estar da sociedade? Tai um combate que consome uma vida inteira. O desafio, no entanto, é talhado para gente de coração bom, mente arejada e espírito libertário como é o caso desses três meninos e dessa princesa do Brasil.
   Allez les enfants! Soyez réalistes, demandez l'impossible! ( Vamos lá crianças! Sejam realistas, exijam o impossível). Até porque, cá entre nós, da vida não se leva nada mesmo. Nem as batatas de Quincas Borba, do genial e libertário Machado de Assis.

Obs: Pessoal, na segunda, dia, 27, vou publicar uma longa matéria sobre as práticas antidemocráticas, entre outras, de alguns integrantes do movimento de combate à corrupção. Ah! por favor, quem quiser postar um comentário e, para fazê-lo,   acessar o ícone anônimo, se for possível, digite o nome e email no corpo da mensagem. Obrigada, Bjs, Eloisa.

20 comentários:

  1. seria eu a princesa Alice?

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  2. Anônimo, por favor, da próxima vez que der uma passada por aqui, deixe de ser um anônimo e entre para o rol das celebridades do blog. Bem, a rigor, Alice é uma menina de 15 anos. Se vc não for ela, como suponho, o fato não impede em nada que vc também seja uma princesa Alice. Desde, claro, que vc tenha essa qualidade de espalhar e zelar pela beleza do mundo. Bjs, e muito obrigada por ter dado um pulo até aqui.

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  3. Nao sei se eh meu estado que me deixa muito sensivel mas esse texto me emocionou....um viva pra esses meninos bacanas e que nao desistam, nao deixem de acreditar Aline

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  4. Aline, se já está assim no primeiro, quando estiver no sexto vai se debulhar em lágrimas mais que mocinha de novela mexicana.Fora isso, esses meninos comovem qualquer um. Precisei deletar trocentas linhas do post para não ficar tão longo. Para vc ter uma ideia, Nahor encontrou a foto pra mim e Solla me deu o passo a passo de como postá-la no post. Ah! vc vai vir pra cá em julho? Pensei nisso e acho que grávidas não podem fazer viagens de avião. bjs, Eloisa.

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  5. Muito bacana, oportuna e lúcida sua reflexão. Porém permite-me uma observação?
    "Tachado de comunista, hipócrita etc." (...) Tachado, neste caso é com CH. Taxado (com X) vem de taxa, imposto, aquele que foi tributado. Coisas do idioma.
    No mais, parabéns!

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  6. Heraldo, obrigada mesmo. Para ser franca, eu ignorava, completamente, essa informação ortográfica/gramatical. Vou fazer a correção agora mesmo. Bjs, Eloisa.

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  7. Conheço um dos citados e confirmo integralmente a qualidade dessa pessoa! Já em relação a questão antidemocrática de grupos contra a corrupção espero que consigam evoluir, pois é uma contradição exigir democracia sem exercê-la.

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  8. Gustavo, eu gosto e admiro muito os três e por n motivos. Também acho uma enorme contradição esse povo falar em democracia e não conseguir exercê-la nem em uma página de uma rede social. Falei sobre o assunto com uma pessoa, inclusive mais velha do que eu, e ele me disse que isso se deve ao fato de as pessoas ainda não saberem exercer a democracia. Eu, francamente, acho que ele foi bem bonzinho. E você, por que acha que esse tipo de coisa rola?

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  9. Marília Santos Fontoura29 de fevereiro de 2012 às 00:06

    Eloísa, seu texto è bastante inteligente e atual Reflete a questao da democracia, que é um valor a ser preservado por todos que agem politicamente, ainda que nao sejam políticos de profissao. O jeito que fala e valoriza os sujeitos, atores de um movimento emergente e conteporâneo, expressa uma sensibilidade e capacidade analítica que dá prazer em ler, pois nos leva a um aprendizado e reflexao. Mas, para além destes aspectos, queria pontuar e agradecer o comentário em relaçao ao jovem Francisco Solla, que me deixou emocionada por me fazer ver um lado de meu filho que ainda nao tinha percebido tao claramente. O bom senso, e neste momento que ele sai de casa pra estudar, sua análise me deu uma certa tranquilidade. Parabèns pelo texto e por ter me apresentado este jovem Solla...

    Marilia Fontoura
    (mae do chico-Francisco Solla)
    marilia@ufba.br

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  10. Marília, fiquei feliz por vc ter gostado do texto e agradeço pelos elogios. Quanto ao seu filho, o que eu disse não é nada perto do que eu percebi. Ele é um menino tão sensato e bacana que todo mundo, entre gente jovem e uns macacos velhos como nós, gosta dele e o respeita muito. Ele é um menino muito especial e vai saber se conduzir muito bem na vida. Bjs, Eloisa.

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  11. Incrivel como Eloisa consegue dar leveza a um tema tão pesado quanto esse.
    Somos combatentes nessa guerra insana e, na maioria das vezes, saimos bem machucados das batalhas.

    Mas aí, prá consolo, tenho guardado comigo um trecho de um texto de Darcy Ribeiro (indigenista, antropologo e politico)

    "..Sou um homem de causas..vivi sempre pregando, lutando, como um cruzado, pelas causas que comovem.Elas são muitas, demais: a salvação dos índios, a escolarização das crianças, a reforma agrária, o socialismo em liberdade, a universidade necessária. Na verdade, somei mais fracassos que vitórias em minhas lutas, mas isso não importa. Horrível seria ter ficado ao lado dos que venceram nessas batalhas"..

    (Rose Losacco, mãe da Alice, rs)

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    1. Oi Rose, obrigada pelo elogio. Adorei o texto de Darcy. Andaram perguntando sobre Alice, mas eu deixei todos curiosos. Para alguns mais assanhadinhos, eu tive vontade de dizer, ela é linda, mas não é pro seu bico. Bjs, Eloisa.

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  12. Obrigado pelas belas palavras querida Eloisa!

    Saudações,

    Virgulino

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  13. Por nada ex-cowboy do sertão. Agora que eu me toquei que vc tem o mesmo nome de Lampião. bjs, eloisa.

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  14. estou esperando ansioso por mais posts em relação as práticas autoritárias dos grupos anti-corrupção!!

    Giderclay Zeballos

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  15. Giderclay, estou há um tempão para publicar um post sobre o assunto. Colhi alguns depoimentos, mas a maioria dos entrevistados se referem a um grupo específico. Tem denúncias em relação a um ou outro, mas, na hora, que eu peço para a pessoa me dar detalhes, ela some ou então pede para eu não revelar o nome. Ou seja, eu fiquei em um mato sem cachorro: se eu publico o post, com n denúncias de apenas um grupo, com nome e tal, com denúncias sobre outros grupos, mas sem revelar os nomes - os entrevistados não querem - e com denúncias sobre outro que não existe mais - os conflitos implodiram o grupo- o que vai parecer? Para mim, vai parecer que eu estou perseguindo um grupo específico. Já tentei resolver o enrosco de todas as formas possíveis, mas não tenho retorno. Enfim, se eu publicar esse post vai dar a impressão que eu estou perseguindo esse grupo específico - aliás, o grupo é antidemocrático, além de cometer outros pecados muito mais graves.Estou tentando solucionar esse problema e, até agora, não consegui. Vc poderia me ajudar nisso? Ou seja, sabe de casos em algum grupo e que as pessoas envolvidas declaram os seus nomes? Se tiver, me dê um toque. Obrigada, bjs, Eloisa.

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  16. Eloisa, como é gostoso ler seus posts. Você descreve e escreve brincando com as palavras.Não importa o assunto, polêmico e interessante, ficamos presos ao texto do início ao fim. Deveria escrever um livro, tenho certeza, que será revelação do ano, pela sua capacidade e qualidade de escrever tão bem. Parabéns pelo trabalho.bjos

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    1. Oi Wilma, obrigada. Estou tendo problemas sérios com a net e mal olho emails. Bjs, Eloisa.

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  17. Boa tarde! passando para deixar um abraço! e parabenizar novamente pelo texto belíssimo. Inspiração total! rs

    Forte abraço!

    Ale Brasil (Virgulino)

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  18. Em 2019 vim reler esse texto e ver como está atual! Beijos Elo!

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