a rua é da gente

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segunda-feira, 18 de março de 2013

Afrodisíacos, uma ilusão irresistível



   
      O moço vira e mexe não exibe aquela perfomance  na cama?  A moça perde o rebolado diante do broto sarado?   Não é preciso arrancar os cabelos. O arsenal de afrodisíacos que ganhou as ruas e lojas virtuais para banir os dissabores da cama faz supor que o paraíso está ao alcance de todos os gostos, bolsos e aflições. São poções e mais poções, incrementadas com tudo aquilo que, rezam as lendas, é capaz de dar fôlego a leão e causar frisson em esfinge, desde que se tenha fé na munição.
      Basta dar um pulo em alguma barraca do ramo para se deparar com uma profusão de folhas e raízes, chazinhos, além de muitas garrafadas contra a disfunção erétil a preços pra lá de atraentes. Os interessados ainda ganham conselhos dos doutores das ervas que se gabam de conhecer seus segredos.
     Aqueles que torcem o nariz para a taba dos pajés podem se abastecer nas lojas virtuais e outros pontos de venda. Há cápsulas e xaropes que prometem fulminar de ejaculação precoce a frigidez .
    Mesmo quem já cruza e descruza pernas como Sharon Stone e pula de janela em janela como D. Juan não resiste à tentação de abrir o apetite com um drinque de ervas afrodisíacas. " Quem acredita pode tomar qualquer coisa que, provavelmente, vai ter um desempenho melhor", afirma o professor Elisário Carlini, do Cebrid, da Universidade Federal de São Paulo.
     O microempresário Reinaldo, de 30 anos, se convenceu de que a fé remove montanhas quando experimentou um  coquetel afrodisíaco. " Tive uma ereção espontânea", afirma. Não, ele não voou no rabo de saia mais próximo depois de beber a taça de tequila com um pozinho de ervas. Em compensação, quando aterrissa na cama, Reinaldo garante que flutua e leva qualquer uma suspirar de prazer. " Fico mais excitado e tenho ereções prolongadas, diz.
     Mas devagar com o andor. Não se imagine que para bater o bolão de Messi no campo do sexo basta tomar um drinque. Esse tipo de afrodisíaco, e todos os outros, estão longe de transformar num passe de mágica um perna-de-pau em craque. Por um simples motivo: eles não contêm substâncias que comprovadamente estimulem a libido e aumentem a potência.
     Vale ressaltar que nove entre 10 remédios que prometem garantir uma perfomance e tanto contêm todo tipo de vitaminas, aminoácidos e sais minerais que não tem ação direta na sexualidade. Eles podem manter o organismo mais saudável e, por consequência, propiciar uma vida sexual satisfatória. Daí achar que coqueteis do gênero são capazes de transformar simples mortais em deuses do sexo vai uma boa distância.  No caso de se estar de farol baixo por causa da deficiência de vitaminas, esses complementos   também vão melhorar o desempenho em geral. O resultado, adverte o endocrinologista Walter, não é imediato. " Nosso organismo não sofre variações bruscas. O indivíduo incorpora nutrientes e, progressivamente, vai melhorando".
     A ciência, porém, não impede que se continue a lançar mão desse  "passaporte" para o Éden.   Reinaldo é um  que sai à caça de tônicos para enfeitiçar as presas mais arredias. " Já rola um clima só em pedir um afrodisíaco. É como lingerie, libera as fantasias".
     É claro que temperar a vida com pitadas de fantasia é, afinal, tudo o que os afrodisíacos podem fazer. Todo mundo sabe disso, ou pelo menos deveria saber, mas, lá no fundo, tem gente que espera mais.
    " Quero ficar mais atrevida e criativa. Mas só me frustro", lamenta-se Lúcia, de 22 anos. Mesmo assim, ela tenta receber essa graça de um prato de ostras gratinadas acompanhado de um drinque que mistura ginseng, catuaba e outros ingredientes.
     Por mais que sonhe implodir limites internos com uns tragos e/ou um prato, ainda não se inventou nada tão poderoso. A rigor, o termo afrodisíaco vem do grego afrodisia e quer dizer, aquilo que restaura as forças geradoras. Nesse sentido, ás vezes, um ou outro estimulante pode dar uma mãozinha à perfomance, como lembra o médico e psicoterapeuta Moacir Costa: " A pessoa que atravessa uma fase de desgaste e apatia pode reacender o desejo ao tomar algumas dessas substâncias"
     O pavor de marmanjos e mocinhas do presente e do passado de negar fogo diante de um belo par de pernas ou um tórax bem definido sempre os levou a avançar sobre poções que saem dos laboratórios ou dos caldeirões das bruxas.
     Aparentemente, todos os povos do Ocidente e do Oriente, desde os babilônios 4 mil anos antes de Cristo, tem nutrido a expectativa de encontrar a virilidade, o amor e o prazer sexual em práticas ou substâncias que concentrem todo esse poder e opere milagres.
    As proezas atribuídas aos afrodisíacos encravaram no imaginário de sucessivas gerações e inspiraram lendas e obras literárias. A Mandrágora, uma comédia de Maquiavel sobre a dissolução dos costumes, põe a erva mágica do título no centro da trama.
    É por isso   que por trás do simples ato de se servir um afrodisíaco está um mundo de sonhos e desejos, provavelmente, mais fortes do que o efeito da poção. " Ele vai agir em quem vive bem com a sua sexualidade e está disposto a dar asas à imaginação", explica Moacir Costa.
    Que o diga o tímido João. Como acontece com o professor aloprado de Jerry Lewis, sempre que toma uma poção mágica, esse designer se transforma em um D.Juan irresistível. " Parto para o ataque em meia hora. Se não bebo, levo umas duas horas", diz ele, que atribui poderes milagrosos ao uísque com ervas. " Fico mais carnal, fogoso. Pego mais firme".
      Quando falta fôlego aos conquistadores, parece que qualquer remédio é bem-vindo.  "Tomei  algumas cápsulas para transar legal todos os dias, mas tive uma tremedeira danada", conta o gerente-comercial João, de 40 anos, que não lembra o nome das malvadas.
  Engana-se quem pensa que a mulherada se poupe para soltar aquela pantera e atrair o sexo oposto. Quem vê as moçoilas comprando vulva de boto no Mercado Ver-o-Peso, em Belém, sabe que não é um exagero. Com o órgão genital do bichinho, elas preparam um unguento para usar em banhos íntimos.
     As menos afoitas, agora, só precisam pintar as unhas para fisgar uns brotos por ai. É que elas  ganharam, recentemente, uma linha de esmaltes afrodisíacos que, na fórmula,  contêm feromônio - substância secretada por insetos e mamíferos com o objetivo promover a atração sexual.
     Essa variedade de produtos mostra que, dos tempos dos romanos pra cá, apenas se ampliou o leque de afrodisíacos. Aliás, boa parte das plantas e testículos de animais que alimentaram esperanças dos povos antigos e primitivos ainda gozam de prestígio. Prova disso são os medicamentos que utilizam alguns desses ingredientes em sua composição.
     Tudo seria muito natural se essas substâncias realmente tivessem uma ação específica sobre a sexualidade. Os extratos de testículos de animais, por exemplo, nem sequer são absorvidos pelo organismo:  eles são degradados no intestino e viram aminoácido".
     O paraibano conhecido como Mestiço, que consome ginseng há mais de 40 anos,  está tão satisfeito com essa planta que nem sequer cogita experimentar outro produto. " O camarada que toma ginseng direto, fica tinindo. Se procura depois que caiu na cama e perdeu a mulher, ai tá lascado".
     Os atributos do ginseng, aliás, são fundamentados numa doutrina medieval. Segundo alguns sábios do período, uma planta já mostrava na aparência a sua função. No caso do ginseng, dizia-se que deixava o homem mais viril porque ele absorvia, ao ingeri-la, toda a potência dessa raiz bifurcada que lembra um par de coxas unidas pelo órgão sexual masculino.
    Filomeno , ao contrário de Mestiço,  provou várias poções do cardápio afrodisíaco para se livrar do  jejum sexual até descobrir e render-se aos encantos da garrafada, mistura de um punhado de ervas curtido no vinho branco. " Agora, estou animado e transo todo dia",  afirma esse balanceiro de ferro-velho de 50 anos,  sem omitir que mal esvazia um litro e já compra outro.   "Estou ficando velho e preciso me cuidar", diz .
  Não é porque ele recuperou a antiga alegria de viver após tomar a garrafada que qualquer um já pode se preparar para soltar fogos se fizer o mesmo. Mas também não pode descartar totalmente a possibilidade. É que a falta de estudos sobre plantas ditas afrodisíacas impede, por um lado, que se conheçam suas funções terapêuticas. E, por outro, contribui para alimentar lendas em torno delas.  
     Tanto é que tem quem atribua seus ímpetos ousados às poções mágicas. " Uma vez tive uma vontade imensa de beijar um desconhecido em uma festa. Fui até ele, beijei o cara e o deixei lá" , conta  a vendedora Regina, de 32 nos, que jamais teria feito tal coisa se não tivesse tomado um uísque com um pozinho de ervas.
       É um erro pensar que apenas a mística dos afrodisíacos enseje atos ousados. Sem o álcool, talvez, o ímpeto não fosse o mesmo. Além de aumentar o desejo, ele tem uma ação depressora no sistema nervoso e joga pra escanteio ansiedade, nervosismo e outros personagens que embolam o meio de campo. Mas o efeito é discutível, como advertiu Shakespeare há mais 500 anos atrás. " O álcool senhor, aumenta o desejo mas impede a realização.
     Na busca da noite perfeita, o perigo pode vir de onde menos se espera.  Nem mesmo os chazinhos podem ser ingeridos sem limites porque uma dose maior pode provocar efeito contrário. Um exemplo corriqueiro é o guaraná em pó, muito usado por quem quer se sentir ligado. Mas uma overdose pode provocar taquicardia, insônia, nervosismo e até diarreia.
    A falta de informações sobre as plantas ditas afrodisíacas tem também razão cultural. Na cultura ocidental, o prazer e o bem-estar são, até certo ponto, relacionados com o pecado. Por isso, segundo Carlini, a medicina se empenha em procurar remédios para combater doenças. Já, na medicina chinesa, a prioridade está nas substâncias que melhoram o estado de saúde, como o ginseng. " A pessoa vive, trabalha e dorme melhor. Com isso, vai ter maior atividade sexual.    
    Na corrida pelo bem-estar, os indígenas também saíram na frente. " Índio com 80,90 anos tem mulher", diz Mamede.   A boa saúde sexual, segundo ele,  dos terenas idosos se deve ao hábito diário de tomar uma infusão de diversas raízes, principalmente catuaba, maripuama, nó de cachorro, ginseng do Pantanal e catingueira. " A raizada repõe energia e fortalece os nervos", diz, e finaliza " Quando a cabeça está forte, o resto funciona. Quem manda no corpo é a cabeça".
    É por isso que quando quando a publicitária Maria Paula está cheia de fantasias na mente e com o namorado ao lado aposta as fichas em um copo de vinho do porto com ervas. " O sabor e o cheiro me instigam os sentidos. Desafogo o ego. Faço sexo com mais vontade e liberdade.
    A exemplo da fêmea do casal de elefantes de uma lenda do século 13, que come uma mandrágora e atiça o macho a fazer o mesmo, Maria Paula convence o namorado dar uns goles no drinque. " Ele fica mais fácil e mais tarado", explica. "Sou sempre tarado", retruca o namorado, o cinegrafista Walter.  O elefante e os cabras machos do planeta certamente vão dizer o mesmo.

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